terça-feira, outubro 24, 2006

Os samurais


Abram alas para o samurai. a multidão baixa os olhos e afasta-se para que o guerreiro atravesse uma estrada congestionada em edo, a futura Tóquio. estamos no século XVIII, mas a cena poderia ocorrer cem anos antes ou depois, num Japão cristalizado nos modelos feudais.

Na rua, e impossível não reconhecer um samurai. Duas espadas, uma comprida e outra curta, destacam-se à cintura. Os samurais pertencem à classe guerreira, a mais elevada, e só eles podem andar com ambas as espadas, símbolos mortíferos da sua autoridade. Este samurai vem vestido de quimono, sobre o qual traz calças, harmoniosas como uma saia, e uma jaqueta curta e solta. Tem a parte de cima da cabeça rapada e o cabelo dos lados e de trás apanhado num belo rabo de cavalo. O samurai anda sem pressa. O governo não o obriga a trabalhar, embora permita que ele o possa fazer para aumentar o seu salário anual de arroz. Cabe-lhe apenas o dever de manter-se em boa forma para combater e defender o regime em tempos conturbados. E se algum homem do povo se atrever a faltar-lhe ao respeito – desobedecendo a uma ordem sua ou embatendo contra a sua espada – o samurai tem o direito (raramente invocado) de matar o ingrato no próprio sítio. Os samurais nascem com o direito à arrogância. Esta classe guerreira prevaleceu na história do Japão durante quase 700 anos, entre 1185 e 1867, marcando um tempo tão implacável e violento – e tão rico em termos culturais – como o da Roma antiga ou o da Europa medieval. Com efeito, os antigos cavaleiros europeus são provavelmente os parentes históricos mais próximos dos samurais. À semelhança dos cavaleiros, os samurais (“aqueles que servem”) formavam uma elite militar, composta por chefes de clãs, ou senhores da guerra, e os soldados leais que combatiam sob as suas ordens. Por tradição, ao imperador era devida a mais elevada vassalagem no Japão. No entanto, quando os samurais se asse-nhorearam do poder, o imperador foi relegado para um plano de figura decorativa e foi eclipsado por um ditador militar – o xogum, ou comandante-em-chefe, designação reveladora do novo domínio dos samurais. Num campo de batalha, os samurais e os cavaleiros ter-se-iam certamente reconhecido. Ambos usavam armadura, combatiam montados a cavalo, com espadas e lanças, punham cerco a castelos e a sua vida obedecia a um código de honra. No entanto, samurais e cavaleiros tiveram uma longevidade diferente: a classe guerreira japonesa beneficiou de um domínio extraordinariamente duradouro, que só terminou quando os vasos de guerra norte-americanos entraram nos portos japoneses, expondo a incapacidade do xogum para defender o país. As forças reorganizaram-se em torno de um novo imperador e derrotaram facilmente o exército do xogum: terminara o reinado dos samurais.


Este é um excerto da reportagem que pode encontrar na edição impressa da NGM – Portugal.

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